Todos os meus olhares são de adeus
Como o último olhar de um condenado.
Mario Quintana
Nas montanhas de edifícios
Moram gentes neuróticas
por trás das janelas fechadas
Que deixam a poluição passar
Nas serestas pelas madrugadas
Que falavam em amor,
lágrimas e saudades
- não há mais
Há sim, uma ironia atroz
Para as pessoas sentimentais
Agora esse saudosismo besta
no meu peito
Pelas cirandas
Pelos “eu sou pobre, pobre, pobre
De marré, marré, marré...”
Agora, só adeus!
Adeus aos poetas...
- há quem diga que sou poeta também -
que diziam coisas belas
e eu não consigo dizer
por mais que me esforce
e meus olhos abertos não vêem
Hoje os olhos são
para tela do cinema
e as imagens da TV
Adeus às pessoas normais
Por que agora há psiquiatras
Psicanalistas, sei lá que mais
Inventos da loucura...
Adeus às palmeiras
Onde cantava o sabiá
Hoje só se vê vigas de concreto
Onde não se assentam sabiás
E não nascem flores
Adeus à arte do cinema mundo
Carlitos, Gordo e o Magro adeus!
Adeus Walt Disney
Adeus a todos os gênios do riso
Adeus às crianças ingênuas
Adeus às poeiras vermelhas
Adeus às matas virgens de saci pererê
Lobisomem e pé-de-cabra
Adeus aos rios de Iara, sereias
E peixes dourados
Adeus às moças nas janelas
A ouvir seresteiro com seu violão a cantar
Por que hoje não há mais janelas
Seresta, hoje, é com toca-fitas
Em desafinado inglês
Adeus às todas coisas que já passaram
Adeus à palavra ADEUS por que hoje é good-bye.
><>Maio de 1973. Publicado em 24/01/1976 no suplemento Texto Prosa & Verso
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