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Maria Gildetti


maria gildetti

com sua boca torta

seu sorriso torto

reclama

- como reclama -

do sapato na lama



maria gildetti

conversa pessimista

doente do pé

ruim da vista

dor nos rins

pressão baixa



mas maria gildetti

na briga, castiga

a inimiga

ajuda

que adula a amiga

Sob Efeito de Ron Merino

Amo-te, menina, amo-te
Esse amor me dói tanto
Esse amor é uma doença
Que dói como encanto

Amo-te, mesmo mentindo, amo-te
porque esse amor é crença
como o ateu que não acredita,
mas é temente a Deus

Amo-te, menina, amo-te,
mas desse meu amor
tenho vago pressentimento
não existe sem firmamento

Aurélio

Lucas bebia muito
Todo mundo falava,
aconselhava Lucas
a não beber

Mas qual!
Conselhos entravam
por um ouvido,
saiam por outro
até que um dia
o filho mais velho
morreu de leucemia

Esperança do Chile


O sonho feito na noite
Vem de longe, além do mar
- Erguido no coração do Chile

O pouso da gaivota
No resto de nau, na praia
- Mais longe se encontra o Chile

Aberto novos campos de guerra
Feitas novas canções de amor
Nas cidades do Chile

A esperança de um dia melhor
Para as crianças, é o sonho
Do coração do povo do Chile...

Segredos Familiares (outra versão)

Entras na casa
e varas todos os corredores
movediços como um cavalo

Não sabes da dor
entras por todos os quartos
guarda roupa, paletó
do quotidiano amargo

Paisagem Cuiabana

As ruas são estreitas
e passeiam em largas avenidas

As vitrines antigas
moram perto das janelas modernas

As casas são de vidros
os prédios de adobe

Moda de Eletrola Quebrada

Eletrola do amor acabado,
amor de eletrola quebrada
- Não muito longe
mora maria josé não sei das quantas
Maria do meu amor empenado
maria de minha vida desenganada

Eletrola do amor perdido
amor de minha eletrola emperrada
Faz muito tempo
que não vejo maria
Maria esqueceu de deixar recado
Maria minha sacola cheia

Sinais antigos

Havia uma infinita alegria
Um pássaro azul
Um retrato de meu pai na parede

Havia flores na primavera...
A moça que morava vizinho cantava
- Um dia subi no muro
pra vê-la cantar e a vi nuazinha
(Aquela pele morena parecia imaculada)
banhando à beira do tanque

A moça continuava cantando
até que me viu masturbando...

Havia uma avenida vazia
de carros, pressa e horário

Prefácio


Este livro não foi feito
Para você ler sentado
Este livro foi feito
Para você ler em pé
No ônibus

Este livro não foi feito
Para você ler deitado
Este livro foi feito
Para você ler sentado
No vaso.

Arquiventura

Olha, a ventura
de estudar arquitetura
para construir “monumentos
de papel crepom”,
templos sem Deus
Edificados sem ternura caem

Olha, esse calado quieto,
que há em mim,
contra as construções do cotidiano,
deverá ser amanhã

Tequererte

Maria, eu sofri essa dor
de te querer-te bem
Por que o bem é assim
quem a gente ama somente
ninguém mais

Maria, eu perdi o poema
que imaginei pra ti
lavra de ventura, sonho, magia
flor pássaro e poesia

Maria, veja que o menino
pensou em te fazer-te feliz
em ventos de tua boca

Na Hora Agá Faltou Luz

Não vi o resultado na TV
Vi o sorriso amarelo e despudorado
Do deputado tentando mentir
Que naquele dia não é JÁ.

Desamor

Maria, disse que iria
nunca mais voltei

Disse que seria
nunca mais eu fui

Disse que teria
nunca mais eu pus

Três meninos

Vinha outro dia

Andando por essas ruas frias

Encontrei três meninos maltrapilhos


Pareciam nossos irmãos

Mais ainda, seus filhos...


Quietos, quietos todos

Ouçam as lágrimas do Cristo

Sempre a favor dos pequeninos


Se os três meninos

Não eram nossos irmãos

O que eram então,

Maltrapilhos por ser?...


Não! Não!

Alguém tem de responder

Por essas três crianças

De olhos opacos,

Cabelos pretos,

E rostos pálidos


Quem? quem?

Ou serei culpada sozinha

Pelo gozo, pelo feto concebido

Ou seremos covardes

Em não manifestarmos?


Conscientizem-se

Elas não nos culpam,

Mas vamos nos defender

com que desculpas?

Se fazemos parte da mão

Que rouba sua comida

E maltrapilha sua roupa

Tempo certo

O relógio, o espaço
horário do tempo certo
O sol mesmo sem se pôr
agora amanhece

Os homens como ovelhas
correm mansos para o pasto
com sinais que determinam
paradas pra não dar tempo

Sonhos não concretizados
lágrimas não se compram
a dor não se reparte
criam a solidão do só

Que mesmo acompanhados
nada mais são que só
Que mesmo ouvindo-falando
nada mais são que surdo-mudos

Lembranças III

O gesto fecundo
fazíamos espontaneamente
Mesmo com frio
acudíamos a todos
com nossas piadas
mentiras de loucos...
(o vento vinha
lembrando minuano)

O Trem Doido de Curitiba

Ao poeta L. E. Fachin

O trem pegou a perna dele
o trem doido de Curitiba
o trem sem alma da cidade
o trem que chega sem aviso

O trem comeu a perna dele
mastigou, ingeriu sem pena
o trem que chega sem aviso
e que nunca fugiu dos trilhos

O trem cumpre seu ofício
pega em todas estações
o trem doido de Curitiba