A eterna reinvenção do jornalismo

Onofre Ribeiro, que chegou na pré-divisão, é figura emblemática do jornalismo de MT

“Jovens não veem TV aberta, não leem jornais, essas mídias terão que ser reinventar”. A constatação quem faz é o jornalista Onofre Ribeiro que, desde que chegou a Mato Grosso, na época do governo de Garcia Neto, vive se reinventando. Começou por aqui como um dos inventores da assessoria de imprensa governamental, hoje se divide entre o rádio, a internet e as palestras em que procura firmar sua particularíssima visão de mundo.

O jornalista Onofre Ribeiro é um contador de causos. E ele conta melhor que ninguém a sua própria história, ou os causos de sua vida. Aos 71 anos, com aparência de um jovem de 60, tem quilômetros e quilômetros de histórias para contar, sem pecha ou qualquer condicionante. “Eu não vou de falar disso” ou coisa do gênero. Pode-se dizer, sem hesitação, que é um homem realizado – com as marcas que vida (de certo modo) tem obrigação de nos proporcionar, porém sem que isso transpareça nas conversas e longos bate-papos, regados a um cafezinho que jamais consegue recusar.

Onofre Ribeiro é mineiro de uma cidade com o singelo nome de Cantos Altos, entre as serras frias de Minas, perto de Araxá que, por sua vez, é pertinho de Uberlândia. Filho de caipiras, Sebastião Felisberto e de dona Julieta, depois que completou o ensino fundamental – que, naqueles tempos, tinha outro termo – e para fazer o segundo grau, hoje conhecido também como EM (ensino médio) mudou-se para Brasília. Motivo: em Montes Altos não tinha escola além do primeiro grau e a família não tinha dinheiro para pagar um internato, por exemplo, em Uberaba, que era muito caro.

Em Brasília, além de ser perto de Montes Altos, tinha parentes e para lá foi e acabou se formando em Jornalismo, da segunda turma da Universidade de Brasília, em 1968.

O ano de 1968 foi o ano que o regime militar se fechou ainda mais, com o general-ditador Arthur da Costa e Silva editando o Ato Institucional nº 5 (AI-5), depois de bombas explodirem nas portas do jornal “O Estado de S. Paulo” (abril) e da Bolsa de Valores de São Paulo (maio).

Onofre Ribeiro trabalhava na editoria de política do “Jornal de Brasília”, que na época era o top, desde 1973. Já casado com Carmelita e pai de três filhos: André, Fábio e Marcelo (Tiago ainda não fazia parte) quando um dia o editor disse a ele: “Olha, o Governo de Mato Grosso está contratando jornalista e quer um profissional com seu perfil, mais conceitual”. Onofre diz que aceitou no ato a proposta sem consultar a mulher.

O ato de aceitar tinha também uma questão doméstica. As famílias de origem dele e da esposa eram enooormes. “Eu era prepotente e independente e as duas famílias, em Brasília, era uma muvuca danada”, ri. Mato Grosso vivia a crise da divisão, daí a busca de jornalista com mais experiência. Onofre lembra que a crise era triangular: Governo de Mato Grosso (sede em Cuiabá), sul de Mato Grosso (Campo Grande) e o governo federal que já tinha endossado a tese da divisão.

O governador José Garcia Neto era contra, “muito contra a divisão de Mato Grosso”, nas palavras de Onofre Ribeiro e, por isso, sofria ataques dos dois lados, tantos dos mato-grossenses do sul e do governo federal. Onofre conta sem nenhuma falsa modéstia, que Garcia Neto precisava de um jornalista mais maduro. Se junta a isso o fato do governador conhecer a reputação da UnB, já que dois filhos dele, Berinho e José Luiz, se formaram pela mesma, portanto tinha um apreço por ela.

“Eu já tinha sido credenciado na Câmara dos Deputados, no Ministério da Justiça, enquanto o pessoal local era muito da casa, muito inexperiente e o fato de ser da UnB também meu ajudou muito”, conta.

Onofre Ribeiro trabalhou no Governo do Estado de 1976 até 1979, e ocupou o cargo de Diretor do Departamento de Divulgação, embrião da Secom de Mato Grosso. Quando Garcia deixa o governo, em 1978, para disputar o Senado – numa das eleições mais disputadas, da história recente de Mato Grosso (quem fala isso é este repórter). Era apenas uma vaga em todo o Brasil, mas em Mato Grosso, por causa da divisão, duas.

O MDB concorria com Padre Pombo enquanto a Arena, na vaga o mandato de oito anos tinha dois candidatos: Arena 1, Garcia Neto, e Arena 2, Benedito Canelas. Canelas é eleito e Garcia suplente. Vicente Vuolo é eleito senador com mandato de quatro anos, por conta que Mendes Canale passou a representar Mato Grosso do Sul. O terceiro senador, Gastão Muller era eleito senador biônico junto com Frederico Campos, governador, pela ALMT.

Onofre Ribeiro narra que – apesar da amizade com Garcia – Frederico assumiu o governo com a recomendação de ‘ferrar’ Garcia Neto e seu grupo. “Todos que eram próximos do Garcia Neto apanharam muito, inclusive eu, que era da comunicação”. Deixa o governo em desgraça e assume o jornalismo da TV Centro América, ainda bem incipiente, quase primitivo. Lá na TVCA conhece e fica amigo de Eugênio de Carvalho que com outros três (Vilson Vicossi, Roberto de Francesco e José Pedro de Freitas) tocava a emissora.

A revista Contato era resultado de um sonho grande. Mato Grosso saiu da divisão com a autoestima em baixa, desacreditado. Onofre foi contratado a partir do número três e chegou mudando tudo. Saindo para rua, percorrendo o estado de Kombi, Brasília, de Fusca, descendo o Pantanal de barco para saber da viabilidade da navegação. Ao mesmo tempo em que se fazia pesquisa para conhecer o novo perfil do mato-grossense. Enfim, a revista virou a militância de Mato Grosso, otimista. Cresceu, virou um grupo com duas emissoras de rádio, a Vila Real, que se desdobrava na AM 590 e FM 99,9.

Durante toda a fase da revista, enquanto esteve afastado do governo, manteve-se firme. No governo de Júlio Campos, por causa de Mauro Cid, secretário de Comunicação, a Contato cai na vala comum. O PMDB compra as rádios e as emissoras passam de mão em mão até virarem a atual Gazeta, de João Dorileo Leal.

Fechado o ciclo Contato, Onofre cria o Sistema 2000 de Rádio. Ele partiu do entendimento de que Mato Grosso não falava com Mato Grosso. Rosário Oeste, cita como exemplo, não conversava com Cuiabá. Cuiabá e Várzea Grande e cada região eram ilhas isoladas em si mesmo. Onofre diz que, na companhia do filho André, numa camionete D10, percorreu cada cidade do interior e acertou com as rádios uma franquia de um jornal diário de uma hora, “Mato Grosso de Ponta a Ponta”, transmitido via Embratel para as 28 emissoras de rádio.

Esse programa inovador, produzido e gerado em Cuiabá, a partir de uma base montada com estúdios de gravação, ilhas de edição, em um prédio na Jessé Pinto Freire, durou cinco anos até ser “detonado”, pelo que protesta Onofre, pelo secretário de Comunicação Paulo Leite (que Deus o tenha), sob a orientação do governador Jaime Campos.

O “Mato Grosso de Ponta a Ponta” tinha um patrocínio forte da Assembleia Legislativa, pois era um canal de comunicação dos deputados com as suas bases. Paulo Leite chama Onofre e propõe mais uma hora de jornal voltado para o Executivo. No início ainda resiste, argumentando que os custos de transmissão da Embratel eram caros. Paulo Leite empenha a palavra, de que não haveria atrasos e é justamente isso que acontece. Onofre Ribeiro recorre aos bancos, na época dos juros estratosféricos, e três ou quatro meses depois quebra. Tira o jornal do ar, vende tudo para pagar as dívidas e fica na lona. “O governo Jaime Campos me quebrou deliberadamente”.

O futuro do rádio? O jornalista, radialista e professor afirma que o rádio atual tem dois ouvintes. O primeiro são os motoristas, nos carros durante o trânsito e o segundo é o ouvinte de fone de ouvido, ouvindo internet. “O ouvinte de casa não existe mais”, afirma.

Para que não se tenha ilusões. A internet será a base para as plataformas das mais diversas mídias. Rádio, TV e, claro, jornais e revistas vão migrar ou serão engolidos pela internet e o celular como o principal ‘receptor’ do rádio. E alerta que essas mídias terão que encontrar uma nova linguagem para esse público novo que está chegando e não aceita mais as mídias tradicionais. “Jovens não veem TV aberta, não leem jornais, essas mídias terão que ser reinventar”.

Nos anos 90, Onofre Ribeiro já escrevia artigos para o jornal A Gazeta, onde ficou até 2004. Passa a escrever neste Diário de Cuiabá e fica como colunista por seis anos. Em 2009 vai para o governo e em 2012, depois de deixar o governo, volta a escrever artigos, novamente n’a Gazeta. Somando tudo tem 23 anos de artigos. Além do jornal, faz conferências, ministra aulas e mantém um site que reúne todos os seus artigos, agenda e uma rápida biografia.

Todas as manhãs, bem cedo, Onofre Ribeiro é um dos comentaristas do jornalístico matutino da Rádio Mix FM, que anima as manhãs de Cuiabá e duela pela primazia de pautar as reportagens do dia com as atrações comandadas por Lino Rossi, na Mega FM, Alfredo Menezes, na Centro América FM e Edivaldo Ribeiro, na CBN.

 


E1A - ONOFRE RIBEIRO

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PEQUENO PERFIL CULTURAL DO ONOFRE

RELIGIÃO: Espiritualista ecumênico. Por que não aceito dogmas.

DIVERSÃO: Filmes, ouço músicas e ouço mesmo, e fazenda.

MÚSICA: Gosto de músicas clássicas, MPB e a música caipira, caipira mesmo. Para escutar, vale tudo: YouTube, o rádio do carro e aparelho de som.

CANTOR: Gosto dos tenores, Plácido Domingos e Pavarotti.

NA MPB: Gosto muuuuiito da Maria Bethânia e Gal Costa.

NA CAIPIRA: Tonico e Tinoco.

LEITURA: Acabei de ler um livro “Os Nefilins”. É uma literatura espiritualista pós-espiritismo que trata da ocupação e da formação da raça humana no planeta. A minha leitura agora está nessa linha. Já li uns 15 livros.

TIME DE FUTEBOL: Não gosto de futebol. Odeio futebol, porque antigamente se dizia que a religião era o ópio do povo e hoje o futebol tornou-se o ópio do povo. O futebol alienou a sociedade da discussão, assim como as novelas e a cerveja. Hoje as pessoas bebem pra esquecer.

O QUE CUIABÁ TEM DE MELHOR: O povo e depois o clima. Quem conhece o frio, como eu, que nasci numa cidade gelada, que para tomar banho tinha que pensar uma semana. O frio entristece as pessoas enquanto o calor é exuberante.

Fonte: DC ILUSTRADO – DIÁRIO DE CUIABÁ


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