De Pêndulo e Bússola


Um dia, fiquei triste, ao notar que andava sozinho
e a multidão em torno de mim também caminhava,
mas não tinha como objetivo o próprio destino...

O meu destino, percebi, é andar sozinho
dentro de casa, no ir e vir da sala à cozinha,
quando abro livros e inicio a leitura dum poema,
ou quando sento num banquinho pra tomar café...

Durante esse caminhar notei, algumas vezes,
que senti pequenas alegrias por amigos que tive,
mas desatentamente perdi durante o caminhar...

querer não é poder, aqui ou nas estrelas

queria o silêncio

dos ventiladores estelares

o vento das galáxias

os ares-condicionados

dos buracos negros

nos arredores de Andrômeda


queria também o barulho

dos sóis se encolhendo

o brilho das estrelas anãs

nas manhãs, tardes e noites

que se formam a cada explosão

na união dos redemoinhos estelares


queria, queria, queria...

não posso, porém, dar um pulo

entre Marte e Vênus

se não tenho a velocidade da luz

ao andar entre passinhos.

Lunares

A lua não é nova
Minguante ri...
A lua é velha
Como meu olhar

Velho como meu olhar
Saio a caminhar
Quando a lua amanhece

#Poema

(
Escrevo poemas

Quando posso

Faço poesias.
)

Poema e Prefácio


Convido o primeiro poeta mor
ao meu poema prefaciar...

O poema sem prefácio
não cabe em lugar algum
em nenhuma estante

O poema, distinto dos outros,
precisa de um endosso,
um avalista, guarda-costas

Sachês Poéticos


No empório literário
comprei três sachês poéticos:
Um hakai, um poema livre
e outros catorze versos de um soneto...

Sobrevivências


Não tem nenhuma poesia guardada
No armário redondo na antessala
Não tem nenhum enigma escondido
No verso de 4,5 sílabas e uma interrogação

Os outros poemas guardados em livros
Poucos são lidos, lembrados, recitados
Ou copiados em superadas máquinas
De xerografia por Bené Fontelles

A poesia, repara, acompanha o poeta
Em sua monumental preguiça domingueira
E fica coçando o saco até o pôr-do-sol

DEPOIS DO AMANHECER

agora que amanheceu
abri os olhos
e vejo o sol passando
de lá para cá, lentamente
não sei qual cor
e a mais viva das cores

todas tem um sentido
de preservação
uma, sempre, procurando
se sobressair sobre as demais
embora o conjunto
forme a natureza

da cor da poeira
ao azul do infinito céu
me imagino em todas
enquanto lavo
a louça na pia.


O SOL PÓS-PANDEMIA

 

Acordei hoje... Antes de sair de casa, escovei os dentes, lavei os olhos como a oftalmologista ensinou e vi o sol nascer. O sol agora é um sol diferente, vejo com outro olhar aquilo que era comum, quotidiano. O sol, se agora vê alegria, as pessoas nas ruas, passos rápidos, rumo à escola, ao trabalho, ao espetáculo da vida, não pode dizer que não viu a tristeza encarcerada. O sol é testemunha: as portas estavam cerradas, o comércio lerdo, as pessoas desconfiadas, arredias com receio do vírus fatal… A lei do tempo, porém, não falha e tudo passa. Agora quem domina o ambiente é a energia, o vigor, a vitória emanados do sol. O poeta pousado em sua rede olha o mundo de amanhã como se fosse agora e concebe o sol como único motor para depois da pandemia.


Teimosia

No fim, quando o dia termina,
o sol despede-se no pôr-do-sol
Quando a noite amanhece
a lua desaba por ocidente

Quando o desalento vira alegria
alegria transforma-se em vida...
Enfim, quando tudo se renova,
tudo teima em virar poesia

Versos Derramados

Promete não ler? Se prometer
escrevo poemas de amor
líricos versos derramados
de uma alegre paixão
que durou pouco menos
de uma eternidade.