Mostrando postagens com marcador #PoemasEmDesavenças. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador #PoemasEmDesavenças. Mostrar todas as postagens

Eu Vi a Igreja Ser Demolida

Eu vi a igreja ser demolida...
Andei por entre bancos
– Ave Maria –
durante a missa

Depois, bem, ia pra praça
ficar passo a passo
– mais ainda –
até a hora de voltar pra casa

A igreja, enquanto guri,
era-me indiferente
Se bonita ou feia, não sei
Se de fé ou precisão de,
andar pelo centro da cidade
só eu sei

Pré-nupcial do poeta e a musa

O contrato pré-nupcial
entre o poeta e a musa
Prevê uma porção de filhos
que possa resultar em livros
Uma cláusula diz que a inspiração
pode vir a qualquer tempo
até quando esteja, o poeta,
filosofando no banheiro.

Tudo Será Remexido

O começo de um poema
pode acontecer de manhã,
no meio da tarde ao entardecer
ou na noite querendo madrugar

O poema, imagina, é úmido
seco, entrecortado, parecido
novo, conhecido, enfim, remexido...

O Propósito da Poesia

Qual o propósito da poesia???
O propósito da poesia
é amolecer o coração do poeta

O poeta de coração mole
tem empatia com a dor
do homem com fome

O poeta de coração mole
sente a dor do pai de família
oprimido e desempregado...

A poesia, fora da poesia,
não tem propósito algum.

Tudo que Tenho

Tenho tudo que tenho
Procuro, não me encontro
E não tenho pra onde ir

Tudo que tenho é meu destino
Nado como peixe só
Mas não sei pra onde ir

Tem uma Fotografia Grudada em Minhas Retinas

Quando olho Cuiabá, como um mosaico,
Vejo sempre a mesma paisagem
E essa paisagem não se dissolve
Mesmo que os anos e anos se passem
E, embora velhinho, essa fotografia
Permanece grudada em minhas retinas

Cuiabá, grudada
Feito foto nas minhas retinas,
Não se dissolve.

Dona Dulce dos Pobres

Dona Dulce dos Pobres,
Por favor, olhai aquele mendigo
Maltrapilho que de tanto socorro precisa...
-Sou eu!

Olhai minhas chagas, tristes chagas,
Que habitam meu coração que de tanto olhar precisa
Para se reformar e tonar-se um coração bom

​Comunicado Público

Até os mais poderosos dos poderosos, um dia, serão contidos e não poderão, mesmo com todo o seu poder, fazer nada. Sem poder apelar, gritar, gesticular e assim ordenar aos subalternos que parem a caminhada à ultima estada

Até os mais poderosos dos poderosos se reduzirão a simples restos mortais e serão deitados em um caixão de cedro ou peroba, não importa, e serão levados solenemente para serem guardados a sete palmos ou queimados em modernos incineradores de cadáveres

Noves fora, o poema

Tira um, noves fora,
o poema se completa
quando a cidade amanhece.

A cidade não sabe
de nenhuma contabilidade poética...
Alguns de seus habitantes talvez.

O poema se ninguém lê
não se tortura, permanece escrito
nas páginas dos livros da biblioteca.

Catar lixo

Quando às vezes saio
para catar lixo em livros de poesia
de poetas menores como eu
chego a encontrar coisas belas
faço alguma tabela
e fico entusiasta:
“Quem sabe um dia, sempre um dia,
Ou mesmo uma hora, escreva assim”.

Déjà Vu

É golpe? Não, é farsa
É farsa? Não, é golpe
Farsa e golpe
Golpe e farsa
Faces duma única moeda
De farsa e golpe...
O que é pior
Acreditar na farsa
Ou se ver no golpe?

Inteiro Teor

Lembrar de um objeto
que nunca existiu, como?
Pois é desse objeto
que meu íntimo sente falta

Ando pelas cidades,
por    suas ruas,
antevejo as fachadas
dos prédios nas sombras

Ando triste, alegre,
sem meio sentir,
sem calcular,
sem inteiro teor

Fotografias

Depois de andar por tantos descaminhos,
descobrir tantos países, arquiteturas antigas,
pedras e deixar marcas em terras alheias,
tirei o marcador, cerrei os olhos e fechei o livro

Depois de fechar o livro, sonhar sonolento,
da viagem não imaginada entre tantas esquinas
de linhas, entrelinhas, mapas reveladores,
virei de lado, arrumei o travesseiro e cochilei

Depois do cochilo, pés nos chinelos, me levanto
e caminho pelos cômodos das recordações
guardadas, não sei por que, a sete chaves

Nunca, friso, especializei em coisa alguma,
sei apenas que ando, caminho, me descubro
quando estou com livros abertos e olhos atentos.

Poema Constatação

O tiro saiu pela culatra
O tiro não acertou o alvo
O tiro acertou o pé
O tiro se viu no espelho

O tiro certo, certeiro
É um tiro de misericórdia?
Um tiro que salva?
Um tiro que não volta atrás?

Quarenta e Quatro

O poeta manequim 44
Pela avenida passeia
De terno gravemente azul
Sem medo nenhum
D'uma sonora bengalada.

Oração Cuiabana

Meu bom Menino Jesus de Cuiabá,
neste momento que estamos sós,
venho lhe pedir, com o coração
derramado, por nossa capital,
tende piedade de nós


Meu Bom Menino Jesus de Cuiabá,
olhai, com seus olhos mansos, as palmeiras
as velhas palmeiras da Praça Ipiranga
e estão corroídas por cupins, e por isso,
Jesus Menino, sendo derrubadas por motosserras


Vigiai, meu Bom Guri, a nossa população
que cresce e desaparece...
O que era pacato agora se esconde
na multidão, no tumulto no trânsito caótico
no barulho ensurdecedor...